Andrew Whitehead
Do Serviço Mundial da BBC
Atualizado em 23
de dezembro, 2011 - 15:40 (Brasília) 17:40 GMT
A classe
média foi a grande protagonista e força motriz das revoltas populares e
ocupações que marcaram o ano de 2011. Esta é a opinião de Eric Hobsbawm, um dos
mais importantes historiadores em atividade.
Em entrevista
à BBC, o historiador marxista nascido no Egito, mas radicado na Grã-Bretanha,
afirma ainda que a classe operária e a esquerda tradicional - da qual ele ainda
é um dos principais expoentes - estiveram à margem das grandes mobilizações
populares que ocorreram ao longo deste ano.
''As mais
eficazes mobilizações populares são aquelas que começam a partir da nova classe
média modernizada e, particularmente, a partir de um enorme corpo estudantil.
Elas são mais eficazes em países em que, demograficamente, jovens homens e
mulheres constituem uma parcela da população maior do que a que constituem na
Europa'', diz, em referência especial à Primavera Árabe, um movimento que
despertou seu fascínio.
''Foi uma
alegria imensa descobrir que, mais uma vez, é possível que pessoas possam ir às
ruas e protestar, derrubar governos'', afirma Hobsbawm, cujo título do mais
recente livro, Como Mudar o
Mundo, reflete sua contínua paixão pela política e pelos ideais de
transformação social que defendeu ao longo de toda a vida e que segue abraçando
aos 94 anos de idade.
As ausências
da esquerda tradicional e da classe operária nesses movimentos, segundo ele, se
devem a fatores históricos inevitáveis.
''A esquerda
tradicional foi moldada para uma sociedade que não existe mais ou que está
saindo do mercado. Ela acreditava fortemente no trabalho operário em massa como
o sendo o veículo do futuro. Mas nós fomos desindustrializados, portanto, isso
não é mais possível'', diz Hobsbawm.
Hobsbawm
comenta que as diversas ocupações realizadas em diferentes cidades do mundo ao
longo de 2011 não são movimentos de massa no sentido clássico.
''As
ocupações na maior parte dos casos não foram protestos de massa, não foram os
99% (como os líderes dos movimentos de ocupação se autodenominam), mas foram os
famosos 'exércitos postiços', formados por estudantes e integrantes da
contracultura. Por vezes, eles encontraram ecos na opinião pública. Em se
tratando das ocupações anti-Wall Street e anticapitalistas foi claramente esse
o caso.''
À sombra das revoluções
Hobsbawm
passou sua vida à sombra - ou ao brilho - das revoluções.
Ele nasceu
apenas meses após a revolução de 1917 e foi comunista por quase toda a sua vida
adulta, bem como um autor e pensador influente e inovador.
Ele tem sido
um historiador de revoluções e, por vezes, um entusiasta de mudanças
revolucionárias.
O historiador
enxerga semelhanças entre 2011 e 1848, o chamado ''ano das revoluções'', na
Europa, quando ocorreram uma série de insurreições na França, Alemanha, Itália
e Áustria e quando foi publicado um livro crucial na formação de Hobsbawm, O Manifesto Comunista, de Marx
e Engels.
Hobsbawm
afirma que as insurreições que sacudiram o mundo árabe e que promoveram a
derrubada dos regimes da Tunísia, Egito, Líbia e Iêmen, ''me lembram 1848, uma
outra revolução que foi tida como sendo auto-impulsionada, que começou em um
país (a França) e depois se espalhou pelo continente em um curto espaço de
tempo''.
Historiador diz que revoluções no mundo árabe tomaram rumo
inesperado
Para aqueles
que um dia saudaram a insurreição egípcia, mas que se preocupam com os rumos
tomados pela revolução no país, Hobsbawm oferece algumas palavras de consolo.
''Dois anos
depois de 1848, pareceu que alguma coisa havia falhado. No longo prazo, não
falhou. Foi feito um número considerável de avanços progressistas. Por isso,
foi um fracasso momentâneo, mas sucesso parcial de longo prazo - mas não mais
em forma de revolução''.
Mas, com a
possível exceção da Tunísia, o historiador não vê perspectivas de que os países
árabes adotem democracias liberais ao estilo das europeias.
''Estamos em
meio a uma revolução, mas não se trata da mesma revolução. O que as une é um
sentimento comum de descontentamento e a existência de forças comuns mobilizáveis
- uma classe média modernizadora, particularmente, uma classe média jovem e
estudantil e, é claro, a tecnologia, que hoje em dia torna muito mais fácil
organizar protestos.''